Este blog é composto de textos extraídos do belíssimo e raro livro de 1938 chamado "Novo Manual das Mães Cristãs" do Reverendíssimo Padre Theodoro Ratisbona da Editora Vozes.

terça-feira, 1 de maio de 2012

XXVIII - Tato maternal



                A mãe dotada de um espírito ativo de ordem e direção possui um tato particular que, em suas mãos, é como uma varinha mágica a operar prodígios.


                Melhor se mostra do que se define esse tato delicado, próprio das mães, que conhece a primeira vista, como o olhar de um médico hábil, os pontos vulneráveis, os momentos em que convém agir ou abster se, as circunstâncias em que é preciso falar ou guardar o silêncio e que, em seus engenhosos expedientes, acha de pronto o calor que aquece, o raio que ilumina, o balsamo que alivia e o sorriso que consola.

                Nada poderia substituir este admirável discernimento; nem a ciência, nem o talento, nem o gênio. É um dom que se desenvolve naturalmente, por si mesmo, e que parece inato no coração das mães que têm inteligência da sua missão e a consciência dos seus deveres. A sua sede é nas fibras íntimas do coração; e a sua ação, quase imperceptível, se exerce bem mais pelo silencio do que pela palavra. O tato vê tudo sem olhar; adivinha os pensamentos; responde sem interrogar e dispõe de artifícios infinitos. Contudo deve estar sempre associado à paciência e a prudência, por que a sua arte consiste em aguardar a ocasião propícia e o seu triunfo resulta menos das combinações acertadas do que da felicidade de chegar a propósito e aproveitar o momento oportuno.

                As mães a quem falta este fino tato ou que não desenvolvem estas impulsões espontâneas, apesar de toda a piedade e de todos os bons desejos, vêem infelizmente os seus cuidados e solicitudes se frustrarem. Fiando-se por demais no seu juízo, que nem sempre é sólido, comprometem as melhores causas, ou pelos passos intempestivos que dão, pelas volubilidades de um gênio caprichoso, ou pelas irresoluções de uma natureza fraca.

                O principal móvel do tato maternal é um critério direito, isto é, mantido sempre na linha da simples verdade. A mãe, cujo espírito se apoia nos fundamentos da fé e que encara todas as coisas da vida sob o ponto de vista dos seus fins imediatos, não tem que recear os desconcertos da imaginação, nem os desvios do procedimento, nem as alucinações da vaidade.

                Para adquirir este precioso tato ou para o aperfeiçoar, quando se é ja dotado dele, alguns conselhos podem ser úteis.

                Primeiramente, quanto às relações com as pessoas que vos cercam, se desejais sair-vos bem, é mister que vos coloqueis ao alcance delas, pois só vos poderão compreender quando as tiverdes compreendido, e, sem que vades até elas, não virão até vós.

                O Divino Salvador, todas as vezes que ensinava aos povos, descia da montanha. O Evangelho insiste sobre esta frase, e, com efeito, a condescendência que se inclina para a fraqueza é o melhor meio de ganhar os corações. Cada idade, cada estação, cada situação tem as suas exigências. O tato atende a essas diversas circunstâncias, regrando por elas o seu proceder.

                Dá a cada flor do jardim os cuidados que ela reclama, levanta as hastes que pendem, decota os ramos que se entrelaçam, preserva do ardor do sol a violeta tímida e umedece o cálice que se abre a exalar o seu primeiro perfume.

                O grande apóstolo soube fazer-se tudo: fraco com os fracos e pequeno com os pequenos. Como uma mãe amorosa, ele nutria de leite a idade de leite e distribuía à idade viril o pão dos fortes.

                Este discernimento, fruto da uma inteligente caridade, exerce sobre os espíritos poderosa influência, a ponto de cativar e abrandar os mais rebeldes e indomáveis. O que há de mais vantajoso e de mais desejável para a mãe do que possuir a confiança dos seus filhos? Inutilmente ela a procurará possuir se não tiver tato. Não se força a confiança, como não se impõe o amor; estes sentimentos não correspondem senão a delicadezas e agrados. Do mesmo modo que o amor filial  se desenvolve espontaneamente sob a ação do materno amor, a confiança do filho cresce em harmonia com a confiança da mãe. Muito mais se consegue, em geral, com uma bondade indulgente, do que com as exigências de uma autoridade minunciosa. Queires vós penetrar nos segredos dessas jovens almas? Desejais conhecer suas inclinações, as suas preocupações e os seus pensamentos íntimos? Não é difícil isto. Lembrai-vos do que fostes na sua idade. O haveis sido então, eles o são hoje; e o que em outro tempo experimentastes, eles por seu turno experimentam agora.

                Não deixes que se reproduzam em vossos filhos as más impressões que dantes sofrestes. Procurai para eles, ao contrário, o bem que teríeis apetecido e as satisfações que teríeis almejado.

                Governar uma família, educar almas, e formar caracteres é uma arte custosa; é a arte das artes, diz um santo doutor. Os que imaginam a ver só encantos e alegrias no meio de louros filhinhos, não conhecem de certo a vida de abnegação e cuidados de uma pobre mãe.
                Os desvelos que os seus filhos dia e noite reclamam põem à prova esse incomparável espírito de dedicação que só as mães possuem. Ser mãe é um pesado e trabalhoso ofício em que não há folgas nem feriados.
     Todavia, se nos múltiplos afazeres maternos, faltar o dom precioso a que nos referimos, as melhores intenções ficarão estéreis.

        O mau êxito tem por causa muitas vezes o demasiado rigor ou a demasiada indulgência. “Não poupeis a correção a vossos filhos – diz a Escritura – Ela dá prudência e juízo; ao passo que o filho indisciplinado será a confusão de sua mãe”. Não comprometais porém, a correção com os caprichos da severidade; abstendo-vos sobretudo, escrupulosamente, de exercer tal ato nos momentos de irritação e de mau-humor.


       Corrige vossos filhos, não porque eles humilham o vosso amor próprio, mas porque ferem a consciência e transgridem a lei de Deus. Por vezes exiges de vossos filhos uma perfeição que vós mesma não tendes, e assim, a força de serdes justa, injusta vos tornais. Os filhos se fatigam com as repreensões que não cessam e acabam por aborrecê-las. A palavra severa não produz salutares efeitos, senão quando é sóbria e oportuna e quando a verdade a sanciona e a bondade a suaviza.

                A experiência de todo o dia contribui para o desenvolvimento do tato maternal, pois as ocasiões em que vos não sairdes bem vos farão evitar cirscunstâncias análogas. As faltas pesadas devem esclarecer a prudência e aperfeiçoar o critério, e os remédios de que se reconhecem a ineficácia indicam a urgência de recorrer a remédios melhores.

                Os bons espíritos não desdenham jamais os conselhos e os exemplos, pois bem sabem tirar proveito, tanto do bom êxito dos outros, quanto do malogro dos seus próprios atos. Consideremos como amigos sinceros aqueles que nos chamam a atenção para os nossos defeitos e acolhamos as observações e advertências, de onde quer que elas venham; a verdade sai as vezes da boca de uma criança. Esta humilde disposição de espírito será extremamente proveitosa para as mães de família, por quanto muitas vezes a excessiva ternura transtorna e cega mesmo as que tem mais penetração, fazendo-as ir de um extremo ao outro, prostrando-as ante o objeto da sua idolatria ou torcendo-as nos vértices do desespero. Não exagerem as mães nem as qualidades nem os defeitos dos filhos; aceitem com reconhecimento os conselhos de uma imparcialidade experiente e desinteressada, e renunciem, se preciso for, a suas próprias opiniões, para adotar as dos outros: é assim que procede a sabedoria cristã.

                Há, enfim, uma prática recomendada pelos mestres da vida espiritual e que concorre mais que todas as teorias para aperfeiçoar o tato das mães. Esta prática é o exame de consciência. Uma vista de olhos lançada sériamente, no fim de cada dia, sobre os atos cometidos durante ele; uma reflexão particular a cerca das faltas mais habituais e um estudo atento e detido dos pontos fracos do nosso caracter e das causas ordinárias das nossas culpas: eis o que forma a mais importante de todas as ciências – a ciência de nós mesmos.


                À medida que nos formos conhecendo melhor, tomaremos também, com um experiência mais madura, resoluções mais perfeitas; e se firme e severamente nos propusermos corrigir-nos, ficaremos aptos para corrigir, por nossa vez, os outros e para os dirigir com verdadeiro tato, circunspecção e felicidade.

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